A mãe estava em casa com seu filho de quatro anos.
Enquanto a criança brincava no pátio da frente, sua mãe se ocupava dos afazeres domésticos.
A bola, com a qual o menino brincava, após um chute mais forte, ultrapassou a pequena mureta que limitava o terreno e acabou parando do outro lado da rua.
O menino sabia muito bem que não podia sair do pátio e muito menos atravessar a rua sem o consentimento da mãe. Mesmo assim, saiu do pátio e buscou a bola, que era o seu tesouro mais precioso.
A mãe, contudo, presenciara toda a cena através da janela, observando atentamente a atitude do filho.
Quando o menino viu que sua mãe estava olhando para ele, levou um choque, por que sabia, não obstante a pouca idade, que havia feito algo que não deveria. Intempestivamente largou a bola e se agachou num canto do pátio, cobrindo os olhos com as mãos. Acreditava que, em assim fazendo, estaria se tornando invisível para mãe que, deste modo, não lhe chamaria a atenção nem lhe imporia nenhum castigo.
Mas o menino estava enganado. A mãe se aproximou dele, muito séria, embora intimamente achasse graça da atitude do filho, repreendeu-o com suavidade pelo que tinha feito, explicando com doçura e carinho as consequências que a sua desobediência poderiam ter acarretado.
***
Nós, diante da morte, nos comportamos como a criança do conto acima, optando por fechar os olhos e fingir que ela não existe.
A morte, contudo, é uma realidade inconteste. Dela, ninguém escapa.
Viver no mundo pensando que nunca se vai morrer é, no mínimo, um absurdo, embora seja o que frequentemente fazemos.
Muito do nosso imediatismo, do nosso consumismo, da nossa competitividade, dentre outras coisas, decorre da visão distorcida que temos tanto da vida como da morte.
É preciso abandonar esse nosso posicionamento infantil, pois ele acaba nos impedindo de viver a vida de forma mais correta, equilibrada e plena.
Talvez tenha sido Francisco de Assis, em sua famosa prece, quem melhor tenha explicado o ato de morrer: “morrendo é que se nasce para a vida eterna”! O conceito de morte, expresso nesta afirmação, é o de que ela nada mais é do que uma transição desta para outra vida. Frente a este conceito, devemos refletir demoradamente sobre o significado da nossa presença no mundo.
Se vivemos uma vida que, após a morte, terá continuidade, num lugar onde, tal qual ocorre aqui, sofreremos a consequência de tudo o que tivermos feito ou deixado de fazer, precisamos, urgentemente, revisar com detalhes o modo como estamos vivendo esta vida.
Quando percebemos que esta vida, sempre curta, limitada, transcorre em função de uma outra vida, mais ampla, imorredoura, é como se uma lâmpada se acendesse em sala escura, a tudo iluminando.
Abrir os olhos para a realidade da morte e compreender-lhe o sentido, possibilita-nos transformar por completo a nossa existência, porque passamos a enxergar muito além do que enxergávamos, seguindo com segurança e proveito pelos caminhos do mundo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário