“A rapidez com que se propagaram, em todas as partes do mundo, os estranhos fenômenos das manifestações espíritas é uma prova evidente do interesse que despertam. A princípio simples objeto de curiosidade, não tardaram a chamar a atenção de homens sérios que neles vislumbraram, desde o início, a influência inevitável que viriam a ter sobre o estado moral da sociedade. As novas idéias que surgem desses fenômenos popularizam-se cada dia mais, e nada lhes pode deter o progresso, pela simples razão de que estão ao alcance de todos, ou de quase todos, e nenhum poder humano lhes impedirá que se manifestem. Se os abafam aqui, reaparecem em cem outros pontos (…)[1].”
Com as considerações acima, Allan Kardec inaugura o primeiro número da Revista Espírita, publicado em janeiro de 1858, destacando a rapidez com que os fenômenos espíritas e o conjunto de idéias deles decorrentes se espalhavam pelo mundo.
Faziam menos de quatro anos que Allan Kardec havia travado os primeiros contatos com a realidade espiritual, através da fenomenologia mediúnica, e menos de um ano que havia lançado O Livro dos Espíritos, quando teve a feliz iniciativa de criar a Revista Espírita.
O ano de 1858, na verdade, é mais que emblemático para a História do Espiritismo, pois além da criação da Revista Espírita, Allan Kardec também assenta as bases da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas. Tanto uma quanto a outra foram de fundamental importância para o desenvolvimento posterior do pensamento espírita. As comunicações espirituais e as observações e estudos dos fenômenos mediúnicos que se efetuavam no seio daquela sociedade, proporcionaram uma fonte vasta e rica de dados e informações que foram, oportunamente, elaborados e organizados por Allan Kardec, que passou a divulgá-los periodicamente na Revista Espírita.
Na época, como ressalta o próprio Codificador, não havia nenhum periódico semelhante em toda a França, destinado ao estudo e exame da questão espírita. É, pois, com este objetivo que nasce a Revista Espírita, o de colocar “(...) o público a par do progresso desta nova Ciência e o [prevenir] contra os excessos da credulidade, bem como do cepticismo(...)”, ao que Kardec acrescenta que é a “(...) essa lacuna que nos propomos preencher com a publicação desta Revista, visando a oferecer um meio de comunicação a todos quantos se interessam por estas questões, ligando, através de um laço comum, os que compreendem a Doutrina Espírita sob o seu verdadeiro ponto de vista moral: a prática do bem e a caridade evangélica para com todos [2]”.
É forçoso notar em Kardec aqueles olhos de ver aos quais se referia Jesus, porquanto, num fenômeno em que a maioria dos seus contemporâneos via apenas um passatempo, vislumbra a chave para decifrar os mistérios que envolvem a existência humana. Ele identifica, na doutrina que codificou, uma proposta de renovação para a Humanidade, entendendo que a compreensão dos fenômenos espíritas e das suas inúmeras implicações exerce uma influência decisiva sobre o melhoramento individual e coletivo, fomentando a “prática do bem e a caridade evangélica para com todos”.
Em 1868, quando Allan Kardec publica a A Gênese, ele explica, na introdução desta obra, que a Revista Espírita, que completava dez anos de circulação ininterrupta, representava “(...) um terreno de ensaio, destinado a sondar a opinião dos homens e dos Espíritos sobre alguns princípios, antes de os admitir como partes constitutivas da doutrina [3]”. Como o caráter progressivo do Espiritismo está subordinado ao controle universal e coletivo das comunicações feitas pelos Espíritos, devendo passar pelo crivo da racionalidade e da concordância, percebe-se que a Revista Espírita desempenhou um papel substancial nas origens e desdobramentos de toda a obra do Codificador, merecendo, por isso mesmo, ser amplamente conhecida e estudada.
Allan Kardec manteve a Revista Espírita de 1858 até 1869, ano em que desencarnou. O valor e a relevância da Revista Espírita é inestimável, pois constitui um repositório documental da História do Espiritismo.
Quem quer ter uma visão mais profunda sobre o que é o Espiritismo ou Doutrina Espírita, precisa, necessariamente, passear pelas páginas da Revista Espírita. A sua leitura possibilita o entendimento do pensamento de Kardec e do processo de gênese e desenvolvimento da Doutrina Espírita.
Existem três excelentes traduções para a Língua Portuguesa da Revista Espírita, uma da Edicel, outra do IDE e uma mais recente da FEB.
Aproveitamos aqui o ensejo para cumprimentar a Federação Espírita Brasileira pelo gesto nobre e desprendido de disponibilizar em seu site [4] o download completo dos doze volumes da Revista Espírita e mais um excelente índice temático, totalmente gratuitos, colocando a divulgação doutrinária acima de tudo.
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[1] KARDEC, Allan. Revista Espírita. Primeiro ano – 1858. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 2004. p.21.
[2] KARDEC, Allan. Revista Espírita. Primeiro ano – 1858. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 2004. p.22.
[3] KARDEC, Allan. A Gênese, os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo. 38.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1999. p.12.
[4] http://www.febnet.org.br
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